5º Congresso da Magistratura Laboral discute o papel do Judiciário na sociedade
- Publicado: Segunda, 08 Mai 2017
Em momentos de tensões e mudanças, discutir quais os efeitos sociais que a atuação do Judiciário acarreta é importante não apenas para divulgar seu papel fundamental como instituição, mas também para ouvir o que a sociedade necessita e preparar-se para atendê-la. "Judiciário e Sociedade" esteve em pauta no 5º Congresso da Magistratura Laboral de São Paulo, nos dias 27 e 28 de abril. O evento reuniu ministros, magistrados, servidores, especialistas e juristas no auditório do Fórum Ruy Barbosa, em São Paulo-SP.
O congresso foi uma iniciativa da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2ª Região (Amatra-2), com apoio da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (Ejud-2).
Aprovada na Câmara dos Deputados no dia 26 de abril, a reforma trabalhista pautou o evento. Crítica da mudança, a diretora da Anamatra, desembargadora Silvana Abramo, ressaltou a importância do congresso da magistratura nesse momento de reformas no Brasil e de que forma isso afetará a atuação da Justiça do Trabalho. "Não pensemos que estaremos isentos dessas consequências. A reforma trabalhista dificulta o acesso à Justiça, diminui o nosso papel". De acordo com Abramo, isso representa um retrocesso: "a Justiça do Trabalho se tornará uma Justiça administrativa". Durante a abertura do evento, a vice-presidente administrativa, desembargadora Cândida Alves, defendeu que é preciso "acreditar na justiça social".
O projeto de lei aprovado, mais amplo que a proposta originalmente encaminhada pelo governo em dezembro, altera mais de 100 pontos da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas). O presidente da Amatra-2, juiz Fábio Rocha, defendeu que "reformas são necessárias e indispensáveis para a democracia; entretanto, não podemos aceitar reformas que aumentam a desigualdade social".
"A Justiça do Trabalho pode acabar mesmo sem acabar"
"Se algum trabalhador resolver procurar a Justiça do Trabalho, será punido. Se fizer pedido de adicional de insalubridade, por exemplo, os honorários periciais, se perder, ele vai pagar, mesmo tendo assistência judiciária gratuita. E se perder qualquer objeto do processo, terá que pagar os honorários advocatícios da parte contrária", avaliou o juiz do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) Jorge Luis Souto Maior, que apresentou o painel do congresso intitulado "Autoridade Judicial e Sociedade Contemporânea". Souto Maior abordou ainda a falta de efetividade da execução com as mudanças propostas pelo projeto de reforma que tramita no Congresso. Para ele, essa é uma "tentativa explícita de destruir a Justiça do Trabalho". E continuou: "É um massacre. Dentro dessa perspectiva, a Justiça do Trabalho pode acabar mesmo sem acabar".
Fez parte também desse painel o jurista e filósofo Silvio Luís de Almeida, que abordou o papel da autoridade judicial na crise. Almeida explicou ainda que a Justiça Laboral é resultado de uma crise, "fundamentalmente da crise de 1929, depois da crise da 2ª Guerra Mundial". Segundo ele, houve uma nova institucionalidade e também uma reformulação dos padrões de organização do capitalismo. Ou seja, "a Justiça do Trabalho é criada para lidar com uma sociedade que se pauta".
"Nossas sentenças não são espontaneamente cumpridas"
Uma das grandes vulnerabilidades que assola atualmente o Poder Judiciário é o descumprimento injustificado à ordem judicial. De acordo com o juiz do TRT-2 Rodrigo Schwarz, "um dos pontos altos da crise em que vivemos é número de execuções forçadas que temos, porque as nossas sentenças não são espontaneamente cumpridas". Explanou que geralmente essas condutas de descumprimento são acintosas e desamparadas de quaisquer fundamentos, "na maioria das vezes (não são cumpridas) porque o devedor não quer". Schwarz lembrou ainda que "no Dia do Juiz do Trabalho, se aprovou uma reforma trabalhista devastadora". Ele compôs o painel "Decisão Judicial: Efeito Social Esperado", junto com o professor da USP Otávio Pinto, que abordou os cortes orçamentários sofridos pela Justiça Trabalhista e a reforma em curso no Congresso. Ressaltou também a "necessidade de esclarecer o direito e garantir a sua aplicação justa."
O desembargador e ex-presidente do TRT-15 Lorival dos Santos abordou, no painel "A Função Revisora dos Tribunais e a Valorização das Decisões de 1º Grau", a complexidade do exercício da magistratura. Defendeu ainda a importância da uniformização da jurisprudência e ressaltou que as decisões de 1º grau devem ser valorizadas, "a menos que tenha destoado do ordenamento jurídico ou se tiver havido cerceamento de defesa". O juiz do TRT-4 Ben-Hur Claus ponderou que esse "é um tema difícil e áspero, especialmente quando tratamos da relação de juiz de 1º grau com o 2º grau de jurisdição, mas há a necessidade de um diálogo permanente".
"Faz parte desta ‘reforma’ o enfraquecimento da Justiça do Trabalho”
Assim, o clima de mudanças e instabilidade foi assunto comum à maioria das palestras. O professor e juiz Marcelo Semer, do TJ-SP, durante sua exposição no painel “O Juiz Social e o Neoliberalismo Constitucional Brasileiro”, foi categórico: “faz parte desta ‘reforma’ (trabalhista) o enfraquecimento da Justiça do Trabalho”. Segundo ele, não é à toa que políticos digam que essa Justiça deveria ser extinta, já que percebe-se claramente que são antagonistas, tanto pelas atuações quanto pelos interesses.
Outros obstáculos foram apontados, alguns até estruturais: segundo o professor e juiz Eduardo Rockenbach Pires, do TRT-2, no mesmo painel, “o capitalismo admite sim a mão de obra escrava”. Para ele, alguns episódios ocorridos ultimamente dão a sensação de que “a Constituição Federal está suspensa”.
O professor Victor Hugo Nazario Stuchi, da PUC-SP, no painel “Direito do Trabalho: Diagnóstico e Prognóstico”, contestou críticas mal embasadas feitas à Justiça do Trabalho: “A CLT nunca teve uma visão rural do trabalhador”. Conforme relatou, “a percepção que tenho é que, se esta reforma passar, será como se tivessem apagado tudo – como se pintassem o muro (onde estariam escritas as leis trabalhistas) de cinza”.
O ministro Augusto César Leite de Carvalho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), no painel “O papel do Judiciário na Efetivação dos Direitos Sociais” também contestou dados utilizados fora de contexto sobre a Justiça do Trabalho, utilizando dados e números dos relatórios oficiais. Ainda nesse painel, o juiz Carlos Eduardo Oliveira Dias, do TRT-15 e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), advertiu para a situação de “anormalidade institucional” e para a “velocidade incompatível (das reformas) com os debates necessários para estas mudanças”.
A Ejud-2 organiza outros eventos com temáticas diversas, ligadas à atuação do Judiciário Trabalhista da capital e à capacitação de seus membros. Como esse congresso, há outros que tem inscrições abertas ao público da área jurídica e demais interessados. Acompanhe a programação na página da Ejud-2 e inscreva-se nos de seu interesse.
Fonte: TRT2